terça-feira, 17 de abril de 2012

O nascimento da rabeca na minha vida

O ano era 1997, e eu tinha 18 anos. Havia acabado de entrar para a faculdade, cursando Biologia na UFRJ. Em tempos pré-internéticos ter um bom gosto musical dava muito trabalho. Comprar discos era um luxo que só era possível guardando muitos trocados, dinheiros de lanche ou passagens de ônibus. A cena rock'n'roll alternativa era o que tínhamos na época, repercutindo ecos do que ouvíamos na saudosa Rádio Fluminense FM e, posteriormente, na também saudosa Rádio Cidade. Quando muito, sabíamos do que se fazia de novo na MTV, que, naquele tempo tocava música, e das boas!

Na meiota dos anos 90 tudo que havia de bom tinha sido feito duas décadas atrás ou vinha de Seattle. O resto era só pancadão, gogode ou danielamercurycaquelabundacheidistria. Até aparecer um pernambucano aloprado, vestido com roupas velhas, cafonas e jogando na nossa cara o anacrônico som regional. Só que ao contrário.

A tamborzada de maracatu chacoalhava uma guitarra que ecoava Beastie Boys. A voz do vocalista dialogava com velhos samples daquelas vozes de liderar quadrilha junina. Ouvir aquilo fez fugir um grito da minha infância feliz no subúrbio, dos carros da pamonha, das buzinas dos doceiros. De tudo de lindo que a gente deixa pra trás só para parecer alternativo e descolado.

Para além do brilhante e atemporal Chico Science, a rádio Cidade tocava, todo fim de tarde, uma versão hardcore de "O cheiro de Carolina", do Gonzagão. Quem tocava era um tal "Jorge Cabeleira".
Taí. Nomes estranhos para bandas que faziam um som mais estranho ainda. E foi no meio das filipetas de shows de bandas como Living in the Shit, Zumbi do Mato, Funk Fuckers e Cabeçudos que me apareceu algo interessante:

"Direto de Recife - Mestre Ambrósio
comemorando o lançamento do filme "O Baile Perfumado"
25, 26 e 27 de julho - 1997"

O local era a antiga Galeria Alaska, folclórico reduto gay do Rio de Janeiro, recentemente reformado e adaptado a receber shows alternativos da cena underground.

Partimos para lá , a turma que só andava de camisa xadrez, calça de skatista, correntinha no chaveiro e tênis All Star (naquela época, duramente garimpado nas velhas sapatarias de Madureira).
-Mas que som eles fazem, cara?
-Ah, uma mistura assim tipo Chico Science, maracatu com rock'n'roll, sacoé?"
-Saquei, boralá!

E entramos no Teatro. O show já estava começando, mas do corredor eu não ouvia a guitarra. nem sinal de distorção. Estranho.

Na plateia, umas 15 pessoas, se muito. Sentamos lá no alto, pra tentar entender o que acontecia. Não era roquenrou, não parecia Chico Science. Um magrinho arranhava o que parecia um violino tosco, enquanto outros doidões sacudiam e percutiam outros instrumentos inusitados enquanto dançavam como se o mundo fosse se acabar.

Joséééééééééé! Tem que tumá cuidado, zé...


De algum modo aquilo mudou minha vida. Para sempre.







Um comentário:

  1. Emocionante esse relato!!! ainda mais da pessoa que fez a rabeca entrar na MINHA vida!!!

    ResponderExcluir